“O MUNDO GREGO”
– As
diferenças entre Atenas e Esparta (II)
Jeremias Macário
No capítulo “Atenas e Esparta”, de “O Mundo
Grego”, o autor A.H.M.Jones mostra as diferenças entre as duas cidades que
sempre lutaram pela liderança da Grécia. Atenas, progressista e democrata, possuía
um centro comercial e industrial (azeite de oliveira) com seu porto Pireu, um
dos maiores do Mediterrâneo. Era uma potencia naval. Cheia de estrangeiros, o
povo embelezou a cidade com templos e soberbas estátuas. Produziu grandes
tragédias através de Ésquilo, Sofócles e Eurípedes, além das comédias de
Aristófanes, e foi berço de historiadores como Tucídides e filósofos do quilate
de Sócrates, Platão e Aristóteles.
A Atenas democrata exalava liberdade de
palavra e de ação (o direito de se pensar e dizer o que se desejasse, mas
dentro dos limites da lei). Platão dizia que em consequência desse estado de
coisas, os cidadãos são diferentes, ao invés de se conformarem a um tipo ideal.
Péricles louvava a liberdade individual. Com isso, Aristófanes produzia
comédias que ridicularizavam as instituições e até filósofos publicavam seus
ataques ao ideal democrático.
Existiam discordância, inclusive contra
Platão que afirmava que o governo era uma arte difícil, que devia ser limitada
aos peritos, homens inteligentes, dispondo de poder sem prestar contas a
ninguém. Em Atenas, os conselhos eram escolhidos anualmente por sorte e nenhum
cidadão poderia servir por mais de duas vezes em toda a sua vida. Como seria
bom se acontecesse isso no Brasil! Será uma utopia?
Os tribunais decidiam os casos privados e
realizavam exames rotineiros dos magistrados ao término de seus mandatos,
julgavam os impedimentos dos generais e políticos e eram árbitros de questões
constitucionais. Os 350 magistrados eram quase todos escolhidos por sorteios.
Ninguém podia ocupar o posto por duas vezes.
Sócrates não concordava com esse tipo de escolha,
mas o sorteio era feito entre os cidadãos que nele se inscrevessem. O povo
exigia um padrão elevado dos inscritos. Depois de um ano de mandato, qualquer um
poderia acusar o magistrado de má conduta, se fosse o caso. O salário era
equivalente a de um trabalhador braçal. Nenhum cidadão podia ganhar a vida com
o salário do Estado. Mais outra vez, uma norma quase que impossível para o
Brasil.
A assembleia controlava a política e os
magistrados, e os generais eram seus servos que tinham de cumprir as ordens.
Atenas foi um estado bem sucedido, o maior na Grécia no século V, e até depois
da derrota na Guerra do Peloponeso, como afirmou o autor. Os cidadãos mais
ricos custeavam os coros, as tragédias e comédias dos grandes festivais pagando
os atores, cantores e todo cenário. Empresário nenhum aceitaria isso aqui. A
democracia proporcionou um alto nível de eficiência administrativa, justiça
social e cultural. Esparta, como dizia Demóstenes, não permitia que os seus louvassem
as leis de Atenas
Esparta gozava de autossuficiência agrícola e
lá os estrangeiros eram mal recebidos e até expulsos. Potência militar, sua força
era o exército e parecia uma aldeia que crescera demais, com uma aristocracia
perfeita e estabilidade política mantida pela monarquia (autoridade absoluta).
Não teve arte, nem literatura e não desempenhou papel na vida intelectual
grega. Era conservadora, apegada a uma constituição arcaica e defensora das
ideias tradicionais. Seus cidadãos eram treinados rigorosamente, desde a
infância, para serem bons soldados, vistos como uma elite, apoiada pelo número
maior de servos, os hilotas.
Os
espartanos mantinham sua supremacia frente aos servos através do terror. Todo
ano, os éforos, principais magistrados da cidade, declaravam guerra aos hilotas
onde permitiam a qualquer espartano matar um servo sem incorrer na culpa de
assassinato. Os hilotas perigosos eram espionados e mortos. Em 424 a.C,
preocupados com a inquietação entre os servos, os espartanos os convidaram para
se alistar no exército dando como recompensa a liberdade. Dois mil deles se
apresentaram e nunca se ouviu falar mais deles. Assim fizeram colonizadores dos
índios nas Américas.
Apesar de tudo, tinham um conselho dos mais
velhos, uma assembleia e uma junta anual de cinco éforos que governavam
Esparta. O método de escolha dos éforos permitia até ao mais humilde dos
cidadãos ocupar o cargo. Aristóteles considerava isso infantil, mas dentro da
classe espartana, sua constituição era tida como democrática. As únicas
virtudes reconhecidas eram o patriotismo, a coragem e a disciplina.
LITERATURA E FILOSOFIA
Em “A Literatura Grega Posterior a Homero”,
R.J.Dover divide o gênero em três fases, o Arcaico (500 a.C.), o Clássico, de
500 a 300, e o Helenístico até o fim do mundo antigo. No Arcaico predominava a
poesia lírica para coro, com Safo, a poetisa que viveu na ilha de Lesbos por
volta de 600 a.C.). Píndaro, de Beócia, foi outro representante da época. O
Clássico foi o coração da literatura onde Atenas tornou-se centro cultural
grego. Na era helenística, a poesia preencheu os espaços vazios deixados pelos
clássicos.
Na comédia antiga, Aristófanes foi o mais
notável, introduzindo comentários satíricos com pessoas vivas. Os autores
ridicularizavam deuses e homens, mas o público condenava à morte quem negasse a
existência dos deuses. A oratória também fazia parte da literatura e Ticídides
foi um deles. Na história, Heródoto começou sua trajetória descrevendo a
derrota dos persas.
Na tragédia grega, Ésquilo (peça sobre
invasão da Grécia por Xerxes), Sófocles e Eurípides foram os maiores destaques.
O primeiro foi autor de “As Suplicantes” onde conta como 50 filhas de Dânao tentaram
fugir do Egito para Argos, para não se casarem com os 50 primos. Das 50, somente
uma fugiu e não assassinou o noivo.
Fez ainda “Prometeu Acorrentado”. O criador
da humanidade foi punido por Zeus por ter dado o fogo aos homens. Levado a uma
rocha, uma águia vinha todos os dias comer seu fígado. Em “Prometeu Libertado”,
o herói usou seu segredo como trunfo.
Sófocles criou “Antígona”, ameaçada de morte
pelo rei de Tebas, Creonte, por ter enterrado seu irmão Polinice (o dever
religioso), quando a ordem era não ter sido sepultado porque ele foi
considerado traidor do reino. Ainda dele, “As Traquinianas” fala sobre os
heróis descendentes dos deuses (o mundo de Homero). Nela, Sófocles descreve
sobre a morte de Hércules, (filho de Zeus), o mais corajoso e o maior
benfeitor. Hércules matou o rei Eurito e saqueou a cidade de Ecália, tudo para
ficar com Iole, a filha do monarca. Como presente, através de seu mensageiro
Licas, mandou como presente para sua esposa Dejanira, várias prisioneiras
capturadas, e dentre elas estava Iole. Pagou caro por isso. Ainda sua, “Édipo Rei” serviu de trama
perfeita para Aristóteles.
O grande Eurípides foi responsável pela peça
“As Bacantes”, o maior de todas suas obras, onde descreve como Penteu, que se
opôs a introduzir o culto de Dionísio no templo, em Tebas, foi feito em pedaços
pela mãe e as irmãs. É uma peça muito forte e chocante em que Penteu roga e
chora para que a mãe lhe poupe. Não houve jeito.
Quanto as obras filosóficas (séculos VI e V)
no mesmo tempo da história, os primeiros pensadores começaram de forma oracular
imitando os poetas antigos, inclusive escreveram em versos na tradição arcaica,
na linha didática e moralista, mais expondo que argumentando. Depois de 400
a.C., Platão introduziu o diálogo e dramaticidade na filosofia, como na sua
obra sobre Sócrates, que não deixou nenhum trabalho.
A filosofia grega, como diz A.H. Armstrong,
começou em princípios do século VI a.C. A primeira data fixa é 585, ano em que
houve um eclipse que Tales de Mileto, o
primeiro filósofo grego, havia previsto. A filosofia pré-socrática
preocupava-se com a natureza e o destino do homem e como deveria viver. Para os
pitagóricos, a alma era um ser divino, caída e aprisionada no corpo de uma
série de reencarnações.
Com Sócrates e Platão (séculos V e IV), a
preocupação central da filosofia grega passa a ser o homem, o que ele é, como
deveria pensar e viver, individualmente e na comunidade. Com Platão, o
principal objetivo dos seus ensinamentos era convencer à pequena minoria a
procurar a verdade sobre o que realmente existe, e ordenar sua vida de acordo
com essa verdade. Na sua filosofia, os problemas centrais são relacionados com
o homem e como ele deve viver na cidade. Ensinava como a vida política, social
e religiosa de uma Cidade-Estado devia ser organizada, de forma que todos seus
membros fossem os melhores possíveis.
Afirma o autor do artigo que Aristóteles, no
entanto, tinha uma filosofia mais ordenada que Platão, sendo o maior
sistematizador da história da filosofia grega. “Sua filosofia é mais rígida,
mais compacta e de menor atração universal que a de Platão”. Depois dele, os
filósofos gregos se preocupavam em encontrar o caminho certo da vida para os
homens.
A educação do tipo
superior, destinada para jovens ricos, era proporcionada pelos sofistas
(Górgias, Protágoras, Pródico e Hípias), os chamados professores viajantes da
arte do êxito, cobrando altos proventos e oferecendo resultados rápidos. Que
diriam nossos instrutores de autoajuda?
Não é fácil dizer quando a filosofia terminou.
Dizem que foi em 529 da nossa era quando o imperador Justiniano fechou a escola
filosófica de Atenas. Terminou com a plenitude da civilização bizantina, quando
o Império Romano tornou-se oficialmente cristão, tendo sua capital em
Constantinopla (dois séculos de vida).
Na ciência, a Grécia também deixou valiosas
descobertas e contribuição para a humanidade, que inclusive serviram de base
para o renascimento. Temos Anaximandro que registrou os equinócios e preparou
um mapa dos céus. Empédocles usou a pipeta para provar a existência concreta do
ar. Outro grande físico foi Anaxágoras
Estudiosos do mundo grego assinalam que a
história da matemática começou com Tales de Mileto, o primeiro filósofo, que
previu na astronomia o eclipse solar de 585 a.C. e teve a noção de que a terra
flutuava na água. No século IV a. C., Heraclides do Ponto ensinava que a terra
tinha um movimento de rotação.
Já Aristarco de Samos (cerca de 250 a.C.)
supôs que o sol e as estrelas fixas são imóveis, mas que a terra era levada em
torno do sol. Os sucessores de Aristóteles, observando que as eclipses centrais
são por vezes totais e outras parciais, concluíram que a lua não mantinha uma
distância constante da terra
Os seguidores de Pitágoras usaram sua
descoberta da estrutura matemática da escala musical como base de uma
complicada teoria semimística de um universo feito totalmente de números.
Heráclito estudou a estrutura da matéria. A Academia de Atenas, fundada por
Platão, se notabilizou pela matemática e classificação das plantas, mas ele
mesmo pouco fez para revitalizar a ciência.
Aristóteles, que pertenceu à Academia de
Platão, reagiu depois contra as tendências do platonismo para um mundo ideal.
Foi contra as formas remotas e reinstalou os objetos do nosso mundo como
verdadeira base da realidade. Ele tinha paixão de naturalista pela observação
minuciosa. Foi ele o fundador das quatro ciências Ornitologia, Ictiologia, Zoologia
e Entomologia. A lógica formal e funcional foi, no entanto, a maior de todas as
realizações de Aristóteles.
Não poderia deixar de citar a Escola de
Medicina, fundada por Hipócrates, na ilha de Cós, que difundiu seus trabalhos
por toda a Grécia. Seus métodos eram científicos no que concerne a observação e
o registro. O objetivo era uma estimativa precisa do curso da doença. É bom
ressaltar, porém, que a medicina foi
mais desenvolvida pelos helenistas.
O MUNDO HELENÍSTICO
As conquistas de Alexandre o Grande marcaram
nova era da história. Dois anos antes da sua ascensão, em 336 a.C., as cidades
gregas haviam sido subjugadas pela força superior da Macedônia de Filipe II.
Rebelaram-se, mas foram derrotadas. Como advertência, Alexandre destruiu Tebas.
Como escreveu o estudioso no assunto, E. Badlan, a era clássica das cidades
gregas desaparecera para nunca mais voltar. “Nenhum período da história
ocidental vira maiores transformações políticas do que o século e meio que se
seguiu ao aparecimento de Alexandre”.
Adorado como um deus pelos seus súditos,
quando o rei morreu deixou sem solução os problemas da sua secessão. Os
generais entraram na disputa do reino e muitos membros da família de Alexandre
foram eliminados. O general Lisímaco controlou as províncias europeias e parte
da Ásia Menor. Seleuco ficou com a maioria das províncias asiáticas, e
Ptolomeu, que morreu em 283 a.C., com o Egito e a Líbia.
No mundo da ambição por poder, tudo foi uma
questão de espera. Quando Lisímaco foi enfraquecido, Seleuco o atacou. Em 281,
os dois travaram em Corupédio, uma das maiores batalhas da história. O primeiro
foi morto e o segundo teve a oportunidade de controlar o império, mas ao cruzar
para a Europa, foi assassinado. Foi ai que os gauleses entraram em cena e
invadiram a Grécia, Macedônia e Trácia.
De qualquer forma, os gauleses terminaram contribuindo
para a estabilização do mundo helénico. Antígono Gonates, na Europa, e Antíoco,
filho de Seleuco, enfrentaram os invasores e foram proclamados salvadores. Por
fim, concordaram em viver em paz no império dividido de Alexandre. Os
antigônidas ficaram com a Macedônia e parte da Grécia, e os selêucidas com
parte da Ásia e do Mediterrâneo. Os ptolomeus se basearam no Egito e na Líbia.
Na Ásia Menor surgiu o reino dos Atálidas em
Pérgamo, cuja capital passou a competir com Alexandria, tornando-se primeiros
aliados dos romanos. Foi dessa forma que esses povos conseguiram estabelecer
seu protetorado sobre a Grécia, em torno de 200 a.C. Os ptolomeus se mantiveram
firmes até o declínio do Ptolomeu V, em 205 a.C. e, finalmente, terminando com
o suicídio da grande Cleópatra, em 30 a.C.
Os reis usaram suas riquezas para transformar
Alexandria numa cidade planejada. Esta capital, com seu Museu e imponente
biblioteca, foi o centro da civilização helenística onde o grego era a língua
oficial. A cidade de Selêucia, sucessora da Babilônia, na Mesopotâmia, chegou a
ter meio milhão de habitantes muitos dos quais de origem grega e macedônia.
As cidades gregas no mundo helenístico
continuaram a ter suas autonomias, e até os reis se curvavam às suas leis. Para
os gregos, a cidade (Cidade-Estado) era a polis, a unidade da política
internacional. O país pertencia ao rei, e a cidade era dona da sua terra. O rei
não podia agir em nome dela. Como a Atenas clássica, a cidade helenística
conduz suas questões internas e seus negócios diplomáticos. Envia e recebe
embaixadores, e celebra tratados sobre assuntos rotineiros.
A
força militar do monarca sempre ficava estacionada nas proximidades das
cidades. Para os amigos do rei estava ali como proteção contra inimigos
externos e sedição interna. Seus comandantes poderiam ser chamados para vários
serviços. Para os inimigos do rei, a força era um exército de ocupação e
instrumento de opressão.
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