Pamonha,
canjica e lero-lero
Nando da Costa Lima
- Eu comprei um chapéu de primeira
em João Couto e já encomendei uma botina 44 bico largo em Seu Zé Pereira,
daquelas que aguente um cabra retado pois vou dançar até rachar o chão, tem
mais de nove anos que não danço um forró em Conquista. Desde São Paulo eu venho
sonhando com isto. Agora que estou por cima da gaita posso até pedir Isidora em
casamento sem correr o risco de ser esculhambado pela família dela. Cê lembra
né, compadre Néu, quase que os irmãos dela me mataram de
porrada só porque eu falei em namoro. Gente é um bicho difícil, se o sujeito
não tiver dinheiro não pode nem sonhar em casar com uma mulher bonita. E
naquele tempo eu era franzino, não sei por que juntou tanta gente pra me dar
pancada. Se fosse hoje eu botava todo mundo pra correr com o meu “três oitão”.
Sompaulão além de me deixar com dinheiro, me ensinou a mexer com gente ruim. O compadre
também não se esquece que eu saí daqui só com a roupa do corpo, o dinheiro que
levei só deu pra pagar uma semana numa pensão barata. Quando acabou o dinheiro
eu comi o pão que o diabo amassou: dormi em banco de praça, apanhei da polícia,
passei muita fome. Só não morri porque Deus é grande. Mas o que mais me perturbava
era a saudade de Isidora e de Conquista.
- Quando eu lembrava do São João só
faltava morrer, chorava como uma criança. Teve uma vez que eu quase “se
suicidei” de tanta saudade de Isidora, se não fosse um amigo eu tinha pulado na
frente de um ônibus. Nem tô acreditando que tô aqui em plena semana de São
João, tô realizando um sonho,compadreNéu. O terno eu trouxe de Sompaulo, mas a
botina e o chapéu eu fiz questão de comprar aqui, eu quero dançar o forró com
produto conquistense. E se tudo correr como eu quero, eu vou entrar na igreja
no dia que eu me casar com Isidora calçando a mesma botina que eu vou usar no
São João, isso foi uma jura que eu fiz há anos.
Aí então
foi o jeito o compadre abrir o jogo...
- Compadre João, eu não quero ser
estraga prazer nem empata foda, mas como você é quase parente eu tenho que lhe
dar uma péssima notícia, só não falei logo porquê da hora que você me encontrou
na frente do bar Lindoya até agora não me deixou abrir a boca, mas você tem que
me escutar, o caso é sério!
- Fala logo, “home”, desembucha.
Foi morte na família???
- Não, é pior...
- Pior que morte de parente, cê tá
doido? Fala logo merda senão vou ser eu quem vai morrer de curiosidade.
- De curiosidade o compadre não
morre não, mas se continuar insistindo nesse namoro com Isidora vai morrer é de
morte matada. Isidora tá noiva pra mais de dois anos...
- E quem é o corno que tá querendo
roubar meu amor eterno?
- É o tenente Marculino “Capadô”
- O quê, compadre?
- É ele mesmo, Marculino “Capadô”.
Você conhece a história dele, né?
- Bom, compadre Néu, aí a conversa
já muda “compretamente”. Aquele homem é o capeta trajado de gente. Vai ser o
jeito eu me esconder até o ônibus que vai pra Sompaulo passar... O compadre
sabe de algum esconderijo?
- Só se for na casa de dona Rosa
Bigode, lá é o único lugar que o tenente não canta de galo. Dona Rosa não gosta
dele. O compadre fica até 7 horas e depois corre pro departamento e pega o
ônibus na estrada. Se você for pro ponto da ETMISA você tá lascado, o tenente
já ficou sabendo que você chegou aqui cheio de onda falando paulista e dizendo
que esse São João Isidora não passava sem você.
E
assim João voltou pra São Paulo corrido, nem a botina foi buscar... Voltou 12
anos depois, só assim é que ficou sabendo que o compadre Néu era quem tava noivo
de Isidora. O tenente Marculino “Capadô”nem chegou a conhecer a beldade, tava
morto e enterrado há muito tempo... E dona Isidora e o compadre Néu vivem muito
bem, já têm 7 filhos e um que vai nascer agora em junho. O nome vai ser João,
em homenagem ao santo e ao compadre...
Mas
a amizade dos compadres, apesar de abalada, continuou firme...
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