UM CENTRO HISTÓRICO AGONIZANTE
Jeremias Macário
Estive em Salvador no
início do mês e confesso que fiquei horrorizado ao visitar o agonizante Centro
Histórico e suas imediações no Comércio. Dá pena e dor ver casarões caindo aos
pedaços como o prédio dos azulejos azuis na Praça Cairu ao redor do Mercado
Modelo que já foi bem mais atraente com os cantadores cordelistas comandados pelo
grande”Bule-Bule”.
Uma nação que não preserva
seu patrimônio artístico e cultural, seus costumes e hábitos perde seu passado
e sua identidade. Isso só acontece no Brasil atrasado onde um Ministério da
Cultura funciona como um jarro decorativo para enfeitar a mesa do governo que
nunca deu prioridade à educação. Os soteropolitanos, infelizmente, continuam
sem entender a importância da cultura do turismo e atendem mal o visitante.
Existem muitos mitos em torno da hospitalidade do baiano e pouca realidade.
É lamentável e vergonhoso mostrar a carcaça
do Centro Histórico de Salvador para turistas, principalmente vindos do
exterior. Os casarões agora estão servindo de moradias para morcegos. Melhor
seria que toda área fosse interditada para que ninguém visse tanta feiura e
desmazelo juntos. Parece que o Centro sofreu um bombardeio de guerra. Mas não,
os governantes e políticos preferem exibir os prédios escorados e as paredes
caiando. Bem que o Pelourinho pode ser usado para cenas de filme de terror, com
morcegos e tudo!
Além do abandono, dá medo andar no Pelourinho
e nas imediações da Igreja do São Francisco e Ladeira da Praça até a baixa dos
Sapateiros devido à quase total falta de segurança nesta época do ano. Com
passos apressados e olhando para todos os lados e cantos, topei com poucos
policiais e só tive um pouco de alívio na Praça da Sé. A sujeira também tomou
conta dos lugares com calçadas quebradas e esgotos à vista. Eu e minha esposa
saímos ilesos com vida, mas roubaram a lanterna do nosso carro.
Andei pela Rua Chile
que me fez aflorar as recordações dos bons tempos dos magazines, da escada
rolante das lojas Americanas, dos cafés, dos bares e boates noturnas
frequentados por intelectuais, artistas, jornalistas e moças lindas da
sociedade que despertavam cobiça aos transeuntes. É claro que a Mulher de Roxo
era a personagem principal que não poderia faltar no cenário. Senti um cheiro
úmido de limo, não o refrescante de antigamente.
Aquilo ali fervilhava de gente dia e noite
até ainda quando funcionava a governadoria. Os governantes e os “entendidos
gestores” da política e da cultura acharam de desativar tudo e deixar no
abandono. Agora estão querendo ativar com a instalação do novo Palace e um
hotel onde funcionou o prédio do jornal A Tarde, na Castro Alves. Não acredito.
Encontrei o poeta condoreiro consumindo sua solidão e revoltado com o que
deixaram de fazer para proteger o Centro Histórico que está dando seus últimos
suspiros de morte.
Bem, desci o Elevador
Lacerda, meu companheiro de viagem quando trabalhava como repórter da área de
economia, e fui atacado por um bando de vendedores ambulantes de correntinhas,
fitas e outras bugigangas. Só de ver o estado dos casarões da Rua Portugal e
adjacências, não deu mais vontade de romper em frente nas outras artérias entupidas
do Comércio. Até que o Mercado está arrumado, mas precisa de mais organização
em seu entorno, especialmente no que tange a segurança.
Com uma lei inócua de isenção do IPTU para os
proprietários que cuidarem de seus estabelecimentos, a Prefeitura Municipal
fala de recuperação do Centro Histórico, mas tudo não passa mesmo de mais uma
falácia, sem praticidade. A conservação do patrimônio arquitetônico tem que ser
uma responsabilidade conjunta do Município, do Estado e da União.
Como um todo, com exceções das belezas
naturais de suas praias e da Baía de Todos os Santos, Salvador está cada vez
mais feia e desumanizada por dentro com as armações pesadas de concreto armado,
como a Via Expressa que matou a Heitor Dias, Baixa de Quintas e a Caixa D´Água.
Senti-me sufocado ao visitar esta região e ver tantos viadutos, sujeira, balbúrdia,
insegurança e congestionamento de carros. A Rótula do Abacaxi continua um
abacaxi azedo e podre.
O Brasil é o único lugar do mundo que tem a
façanha estúpida e ignorante de deixar ao abandono e destruir seus lugares
históricos, monumentos, prédios e marcos do passado. Por falta de educação e
condição social negada aos brasileiros, os vândalos roubam e depredam tudo que
represente a arte. E assim, o país vai apagando seu passado de história.
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