PGR EM PALPOS DE ARANHA. JANOT MANDA APURAR ENVOLVIMENTO DE PROCURADOR NA DELAÇÃO DA JBS
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, anunciou nesta
segunda-feira (4) que determinou a abertura de investigação para apurar
indícios de omissão de informações de práticas de crimes no acordo de delação premiada dos executivos do grupo J&F,
controlador do frigorífico JBS. Segundo Janot, dependendo do resultado
da investigação, os benefícios oferecidos no acordo de colaboração de
Joesley Batista e de outros dois delatores poderão ser cancelados.
Em um pronunciamento na sede da Procuradoria Geral da República (PGR), o
chefe do Ministério Público informou a jornalistas que os
investigadores obtiveram na última quinta-feira (31) áudios, com
conteúdo que ele classificou de "gravíssimo", nos quais um dos donos da
empresa, Joesley Batista, conversa com Ricardo Saud, diretor
institucional da J&F e um dos delatores da Lava Jato.
No diálogo, ocorrido no dia 17 de março, os dois conversam sobre uma
suposta atuação do ex-procurador da República Marcello Miller para
ajudar os executivos a fechar a delação. Na época, Miller ainda
trabalhava no Ministério Público.
Saud fala ainda no áudio de uma conta corrente que tinha no Paraguai
não informada no acordo de delação, fechado em maio deste ano.
A revisão da delação, destacou Janot, atinge três dos sete executivos
da empresa que fecharam a delação. Além de Joesley e Saud, também será
investigado Francisco de Assis e Silva, advogado da empresa.
"Determinei hoje [segunda] a abertura de investigação para apurar
indícios de omissão de informações sobre práticas de crime no processo
de negociação para assinatura do acordo de delação no caso JBS. Áudios
com conteúdo grave, eu diria gravíssimo, foram obtidos pelo Ministério
Público Federal na semana passada, precisamente, na quinta-feira, às
19h", afirmou Janot na entrevista concedida no auditório da PGR, em
Brasília.
Ainda de acordo com o procurador-geral, a análise da gravação revelou
diálogo entre dois colaboradores "com referências indevidas à
Procuradoria Geral da República e ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo ele, a investigação poderá levar à eventual rescisão do acordo
de colaboração, hipótese em que apenas os benefícios obtidos pelos
delatores são anulados, mas não as provas entregues por eles:
A eventual rescisão do acordo não invalida as provas até então oferecidas. Conforme a lei que disciplina a colaboração premiada, se a culpa do colaborador ensejar a rescisão do acordo, ele perde todos ou alguns dos benefício, depende de como vamos modular isso.
"E o Estado aproveita todas as provas apresentadas pelos colaboradores.
Isso é o que diz a lei e essa é a responsabilidade imposta na conduta
dos colaboradores desde o momento que fazem a colaboração até o momento
da conclusão dos processos penais. Ao final do processo penal, será
apurada a eficácia [da colaboração]”, acrescentou Janot.
Novo áudio
Segundo Janot, o áudio foi entregue na semana passada pelos próprios
delatores da JBS para complementar a delação premiada. A conversa entre
Joesley e Saud teria quatro horas de duração, parte dela com “meras
elucubrações”, mas que, segundo a PGR, devem ser apuradas.
O arquivo não está sob sigilo, mas será enviado antes para o ministro
Edson Fachin, relator do caso no STF, para análise. Ainda nesta semana,
Joesley, Saud e Assis serão chamados a depor e esclarecer a conversa
gravada.
Caberá ao ministro liberar o conteúdo do áudio, que deverá avaliar que
partes deverão ser excluídas por tratarem da vida privada e íntima de
pessoas não investigadas.
O colunista do G1 Matheus Leitão apurou que a investigação sobre a suposta omissão de informações no acordo de delação premiada deve terminar até o final do mandato de Janot à frente da PGR.
Apesar de não definir um prazo publicamente, nos bastidores
investigadores afirmaram ao colunista de que tentarão elucidar os fatos
até 15 de setembro, último dia útil de Janot no cargo. A nova
procuradora-geral da República, Raquel Dodge, assume a chefia do
Ministério Público no dia 18 de setembro.
O que disse a J&F
Em nota divulgada após o pronunciamento de Janot, a defesa dos
delatores da J&F chamou de "interpretação precipitada" a análise do
Ministério Público sobre o material entregue à PGR pelos executivos do
grupo empresarial.
Os advogados disseram no comunicado que o episódio será "rapidamente"
esclarecido, "assim que a gravação for melhor examinada".
"Conforme declarou a própria PGR, em nota oficial, o diálogo em questão
é composto de 'meras elucubrações, sem qualquer respaldo fático'. Ou
seja, apenas cogitações de hipóteses – não houve uma palavra sequer a
comprometer autoridades. É verdade que ao longo do processo de decisão
que levou ao acordo de colaboração, diversos profissionais foram ouvidos
– mas em momento algum houve qualquer tipo de contaminação que possa
comprometer o ato de boa fé dos colaboradores", complementa a nota dos
delatores da J&F.
Acordo de delação
O acordo de Joesley Batista, homologado por Fachin em maio deste ano,
prevê que poderá haver rescisão do ato “se o colaborador mentir ou
omitir, total ou parcialmente, em relação a fatos ilícitos que praticou,
participou ou tem conhecimento”.
Outra cláusula diz que, em caso de rescisão por culpa exclusiva do
delator, ele “perderá automaticamente direito aos benefícios que lhe
forem concedidos em virtude da cooperação com o Ministério Público
Federal, permanecendo hígidas e válidas todas as provas produzidas,
inclusive, depoimentos que houver prestado e documentos que houver
apresentado, bem como válidos quaisquer valores pagos ou devidos a
título de multa”.
Procurador da Lava Jato
Na gravação, há relato de conduta criminosa por parte do ex-procurador
da República Marcelo Miller, auxiliar próximo de Janot que deixou o
Ministério Público neste ano para atuar em um escritório de advocacia
que atende a JBS. Posteriormente, ele foi desligado da banca.
Na PGR, ele trabalhou como auxiliar direto de Janot por três anos, inclusive, em casos ligados à Operação Lava Jato.
“Se [Miller] descumpriu a lei no exercício de suas funções, deverá
pagar por isso. Não só ele, qualquer pessoa que vier a ter descumprido
deverá pagar. Não há ninguém que, republicanamente, esteja a salvo da
aplicação da lei”, observou o chefe do MP.
Em um comunicado divulgado durante a coletiva de Janot, a Procuradoria
Geral da República informou que os novos áudios entregues pelos
delatores da JBS indicam que Marcello Miller atuou na "confecção de propostas de colaboração" do acordo
que viria a ser fechado entre os colaboradores e o Ministério Público
Federal. Além disso, eles teriam conversado sobre ministros do Supremo.
"Consta do vasto material entregue à PGR diversos áudios, um dos quais
possui cerca de quatro horas de duração, aparentemente gravado em 17 de
março deste ano, e traz uma conversa entre os colaboradores Joesley
Batista e Ricardo Saud. Apesar de partes do diálogo trazerem meras
elucubrações, sem qualquer respaldo fático, inclusive envolvendo o
Supremo Tribunal Federal e a própria Procuradoria Geral da República, há
elementos que necessitam ser esclarecidos", diz trecho do comunicado da
PGR.
'Não falo sobre isso'
Em seu último dia de visita oficial à China, Michel Temer foi
questionado por repórter e aos jornalistas, o presidente afirmou que não
iria comentar o assunto e se limitou a dizer que está sereno.
"Não falo sobre isso. Realmente, eu tenho que ter a maior serenidade,
como sempre tive. Respeito todas as decisões que forem tomadas pela
Justiça, pela Câmara dos Deputados, pela Procuradoria Geral. Eu tenho
que respeitá-las, mas não devo falar uma palavra sobre isso", declarou.
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