sábado, 6 de janeiro de 2018

JEREMIAS MACÁRIO - COLUNISTA VIP:

DOS SUMÉRIOS A BABEL (VI)
                O MITO DE ADAPA E O DIREITO PENAL
Jeremias Macário
Inventiva, a civilização sumeriana é rica em deuses e lendas, conforme narra o autor de “Dos Sumérios a Babel”, Federico Arbório Mella. Uma das mais conhecidas e perfeitas é “O Mito de Adapa”, segundo o escritor, usada até nas escolas do Egito.
No segundo milênio A.C., sob o cunho de Hammurabi, Babel se destacava como capital espiritual e farol da civilização da Ásia Anterior. Extraída das escavações arqueológicas, na forma das tabuinhas, nesta época a língua diplomática e comercial internacional era o acádico-babilônio.
  Na religião, o culto na Suméria era disciplinado em todo país, mostrando quais deuses menores deveriam ser reverenciados. No grande templo de Marduk, por exemplo, não se adorava apenas ele, mas sua mulher, seu filho, sua família, toda a corte, ministros e, por fim, seus quatro cães de caça.
  Conta a lenda que Ea, ou Enqui, procriou Adapa dando a ele ciência e sabedoria, menos a imortalidade. No templo de Eridu, na qualidade de sacerdote, Adapa trabalhava como cozinheiro-mestre e camareiro do seu pai.
  Um dia Adapa amanheceu aborrecido e aprisionou o vento sul, quebrando suas assas, o que o impediu de soprar. Então, o deus Anu o convocou para que ele justificasse sua conduta inesperada. Antes de se apresentar, o pai orientou o filho sobre o melhor modo de se comportar para não ser condenado pelo deus.
  O pai ainda alertou o filho de que Anu podia lhe oferecer como castigo o pão e a água da morte, devendo ficar prevenido para não se alimentar. Além do mais, aconselhou que se apresentasse vestido de luto diante do tribunal de acusação.
  Disse também ao filho que se Tammuz e sua mulher Guichzida lhe perguntassem o porquê da vestimenta, deveria responder: “Estou de luto pela morte de Tammuz e Guichzida”. Com isso, os dois ficaram tão comovidos com a resposta que resolveram interceder em seu favor para que Anu não o castigasse como estava previsto.
  O deus ficou tão penalizado com o pedido que decidiu oferecer pão e água da vida para Adapa. Porém, seguindo o concelho do pai,ele recusou a oferta, perdendo assim a ocasião de obter a imortalidade definitiva.
DIREITO PENAL
 Como o Código de Hammurabi era muito rígido e rigoroso, os legisladores sempre procuravam meios de contornar as punições e recorriam às leis de Ur-Nammu, com atenuantes e penas substitutivas. As mais severas eram prescritas para os delitos contra a moral (homossexualidade). No caso de assassinato, a pena de morte só seria executada se o acordo de ressarcimento dos donos da família ficasse impossível.
  Entre a nação hitita, a pena capital era aplicada para quem roubasse a lança colocada à frente do palácio real de Hattusa, símbolo da realeza. Para os outros delitos, as penas eram pecuniárias. Quem ferisse seu semelhante, por exemplo, pagava a multa até o final do tratamento, substituindo a vítima no trabalho.
 No caso de homicídio, as indenizações eram imensas. Se o assassino se encontrasse foragido, ou não fosse encontrado, toda cidade onde aconteceu o crime responderia integralmente pelo pagamento. O roubo de gado era reprovável e custaria caríssimo. Quem roubasse uma vaca era obrigado a restituir trinta rezes.
“GUGGU DE LUDDI”
Depois de conquistar e arrecadar os tributos dos territórios da Palestina e da Síria, Assurbanipal (669-627 a. C) entra em contato com o distante país, cujo rei Guggu de Luddi (Guigues da Lídia) lhe envia uma embaixada. Após muitas dificuldades para entender a língua dos lídios, concluíram que eles estavam pedindo auxílio dos assírios contra os cimérios.
  Na consulta, Assurbanipal se dirige a Guggu, rei de Luddi, região além-mar, dizendo que em sonho Assur fez aparecer o seu nome e avisou para abraçar os pés de Assurbanipal e abate em seu nome os teus inimigos. Assim Guggu pôde vencer os cimérios que oprimiam os habitantes de seu país, que não temiam os meus antepassados, nem a mim.
  Diz o documento que Guigues enviava fabulosos presentes para Nínive para obter ajuda, só que o rei aceitava todos e deixava que Guigues se virasse sozinho. Percebendo o descaso, Guggu decidiu procurar aliados mais interessantes e cortar relações com a Assíria. Enviou mercenários a Psamético, filho de Necau, que tinha sido morto na defesa de Mênfis.
  Sabendo do fato, Assurbanipal desferiu contra ele uma maldição: “Possa seu cadáver ser lançado frente aos seus inimigos e que eles possam levar embora os seus ossos”. Os cimérios invadiram o país e Guigues foi sucedido pelo filho Ardis que foi até Assurbanipal rogando: “Seja benigno comigo, teu humilde vassalo, e não me impõe o teu jugo”.
  Muito astuto e inteligente, Psamético expulsa as guarnições assírias e sobe ao trono, como faraó. Por sua vez, Assurbanipal desinteressa-se do distante rival, mas outras ameaças surgiram através de Urtacu, rei do Elam que, com suas artimanhas, tentou invadir Babilônia, em 664 a.C. Assurbanipal apressou-se em punir o traidor, mas este foi assassinado pelo irmão Teumman, o qual também pretendia eliminar seus dois sobrinhos legítimos herdeiros do trono, que fugiram para Assíria.
Teumman queria a extradição dos sobrinhos, mas, como resposta Assurbanipal marcha com um grande exército contra Elam. Teumman, ao ver o exército inimigo, retira-se para defender Susa. O rei assírio entra em Susa, manda decapitar Teumman e seu filho, e entroniza os sobrinhos.
EPISÓDIO BOCCACIANO
  De acordo com o historiador viajante grego Heródoto, o Guigues é protagonista de um famoso episódio bocacciano. Candaules, rei da Lídia, estava loucamente enamorado pela sua própria esposa, que não cansava de exaltar sua beleza, sobretudo ao seu amigo confidente Guigues, irresponsável oficial da guarda da corte de Sardes.
  Cansado de ouvir sempre a mesma conversa, Guigues deu algum sinal de enfado, de modo que Candaules, um dia, fez para ele o seguinte discurso: “Ô Guigues, como tenho a impressão que não me crês quando falo da beleza da minha mulher, quero fazer de modo que a vejas nua”.
Guigues, então, protesta: “Ô, meu senhor, que discurso insensato fazeis-me, incitando-me a contemplar nua a minha rainha? A mulher, junto com as vestes, despe-se também do pudor. Já estou convencido que ela seja a mais bela de todas as mulheres e, por favor, não me sugeris coisas tão inconvenientes”.
  Acontece que Candaules não se dá por vencido com o argumento do amigo, assegurando a ele que a rainha não se aperceberá e obriga-o a esconder-se no quarto onde, quando a mulher se despir, Guigues terá por um momento de admirar sua graça. No entanto, a rainha o surpreende e premedita a sua vingança.
  Na manhã seguinte, manda chamar Guigues, ao qual impõe a seguinte ordem: “Ou matas Candaules e tomas a mim e ao trono de Lídia, ou matas-te agora mesmo, para que não mais vejas o que não deve ser visto”. O oficial a suplicou para que não impusesse uma escolha tão dramática, mas a rainha foi irredutível.
Guigues optou pelo mal menor e matou Candaules enquanto dormia e tornou-se rei da Lídia. Para os lídios, segundo Heródoto, o ser visto nu, mesmo para um homem, é coisa vergonhosa.

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