CURURU
Ricardo De Benedictis
O que é, o que é...? Tem cara de
sapo, apelido de sapo, só anda dando pulinhos, age como sapo, é frio feito
sapo, mas não é batráquio?
É por essas e outras que os humanos
se diferenciam das outras espécies animais, apesar de terem a mesma origem e
destino. Todos somos pó e ao pó voltaremos, segundo conceito universal que
jamais foi contestado, até pelas mais ortodoxas religiões, criadas pelo homem
para subjugar seus semelhantes.
Pois bem. Se formos analisar o
zoológico terráqueo ao qual pertencemos, certamente o leitor teria um, dois ou
até, muitos exemplos de figuras como a que desejamos situar neste
despretensioso texto. E não vale colocar
entre tais elementos, os cínicos, apenas por serem cínicos; os sem caráter,
apenas por não terem sido dotados de ética, moral e outras características
inerentes às pessoas decentes; os desonestos, os pusilânimes, os hipócritas, os
falsos, os intrigantes, os invejosos, os gulosos, principalmente se a ‘gula’
for aquela insaciável sede do erário, etc.
Pois bem. O destino deste intróito é
para um ‘cururu’ que conhecemos há uns vinte e cinco anos e que já conseguiu
enganar centenas, quem sabe até, milhares de pessoas de boa fé. Aqui e alhures,
sem ser alcançado pela Justiça dos Homens.
O fato que vamos narrar, nos foi
contado por uma das suas vítimas, uma pessoa experiente em matéria comercial,
mas que se deixou levar pela lábia e pela apresentação que lhe foi feita do ‘batráquio’
– segundo o amigo da vítima, ‘homem possuidor de muita terra em locais nobres
da cidade’, cujas áreas tiveram valorização galopante na primeira década do ano
2 mil do terceiro milênio.
A vítima que não terá seu nome
revelado pois nem sabe que estou narrando tais fatos, trouxe alguns investidores
paulistas, interessados em se instalarem na cidade. E o ‘batráquio’ se deu bem.
Vendeu uma grande área e recebeu ‘cash’. Numa dessas transações, passou a
vítima para trás, mas continuou a assediá-la para novos negócios,
comprometendo-se a ‘acertar’ a pendência. Feito o negócio, tornou a passar a
vítima para trás, mais uma, duas, três vezes, até que a vítima resolveu
vingar-se do seu traidor. Como sempre, conseguiu novos compradores para uma
grande área do ‘batráquio’, mas desta feita o cururu teria que ir à China, já
que os investidores residiam em mansões, nas imediações de Pequim. O ‘batráquio’
entrou em êxtase e garantiu que pagaria as pendências com a vítima sob a
condição de que ela o acompanhasse nessa longa viagem. A vítima, entretanto,
disse-lhe que não poderia ir, mas tinha uma brasileira sua amiga e corretora,
que havia conseguido a realização do negócio, que também morava há alguns Kms. de
Pequim, que o receberia no aeroporto e o hospedaria em local próximo à sua casa
para ficarem em permanente contato. Assim o ‘batráquio’ viajou para o outro
lado do Planeta, levando uma cueca grande cheia de dinheiro, em notas de 50 e
100 dólares, devidamente instruído pela corretora Mary, quanto ao valor nominal
das notas. O ‘batráquio’ levou cerca de 60 mil dólares, apenas para as despesas
de hospedagem e locomoção na China e
pagamento de comissões, acertados com a corretora. Lá chegando encontrou a Mary
no aeroporto com um cartaz de alerta, escrito em português, no qual se
identificava.
- ‘Que mulher linda’, pensou o ‘batráquio’.
- ‘Eu hoje vou me dar bem’... Recebeu um abraço e beijinhos no rosto gordo e
com aquele bocão imenso deixou um pouco da sua ansiedade no rosto da bela Mary.
Ela o alojou em seu carro e viajaram por cerca de duas horas para a zona rural
e lá ela o hospedou numa ‘pousada’ de estrada. Conversaram, marcaram encontro
para o dia seguinte e despediram-se. Como combinado ela voltou no horário
aprazado e disse-lhe que os investidores haviam feito uma breve viagem, mas que
estariam na pousada no dia seguinte à tarde, O ‘batráquio’ queixou-se de estar
só, em lugar esmo, que não sabia falar mandarim, língua local, nem inglês e que
tinha dificuldades de pedir as refeições. Ela quis saber o que ele gostaria de
comer no café da manhã, no almoço ou no jantar e foi anotando o que era possível,
de acordo com o cardápio que se encontrava no quarto da vítima. Anotou em
mandarim o nome dos pratos pela ordem e disse: - Na hora, você diz para o garçon
qual desses você quer, Cada um está em papeleta separada com um lembrete no
verso: café da manhã, almoço e jantar. Assim fica fácil.
Como o ‘batráquio’ mostrou-se
preocupado em ser furtado com a quantia que levara do Brasil, a Mary pediu que
deixasse a grana com ela. Ele só iria precisar do dinheiro quando fosse pagar a
conta da pousada que poderia ainda ser através do cartão internacional que
portava. O ‘batráquio’ pegou a cueca com os 60 mil dólares e entregou a Mary,
desculpando-se pelo fato de ter levado a grana na cueca. – Você sabe, né...
Seguro morreu de velho, falou sorrindo, as bochechas a balançarem bestialmente.
Esta foi a última vez que o ‘batráquio’
viu a Mary, cujo nome verdadeiro era Lurdes e tratava-se de uma espécie de ‘pistoleira’,
habituada a dar o golpe conhecido por ‘boa-noite, Cinderela’. Batráquio passou
mais uma semana e como não tivesse como saber quem eram os investidores, muito
menos onde encontrar aquela linda mulher, teve que gastar um dinheirão para
voltar ao aeroporto e pegar o avião para São Paulo.
No dia seguinte ligou para a vítima
que havia combinado tudo com a corretora de araque (uma mulher de programa que ele
conheceu na Bahia e habituada a dar golpes), apenas buscando vingança. Uma
pequena vingança para o mau caráter do ‘batráquio’ que nunca mais o procurou e
mais: que não conta este fato a ninguém. Nem a pau! Afinal, ‘batráquio’ é o rei
dos golpes e não chora no pé do caboclo, se é que me entendem os leitores...
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