BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O STF (Supremo Tribunal Federal) negou
nesta quarta-feira (26), por 7 votos a 2, um pedido para que eleitores
que tiveram o título cancelado pela Justiça Eleitoral por faltarem à
revisão periódica -que inclui o cadastramento biométrico- pudessem votar
neste ano.
A maioria dos ministros acompanhou o relator da ação, Luís Roberto
Barroso, decidindo pela validade de cancelar o título do eleitor que não
comparecer ao recadastramento.
De acordo com o TSE, 5,6 milhões de pessoas faltaram à revisão
eleitoral feita entre 2016 e 2018. Desse total, 3,4 milhões tiveram os
títulos cancelados por motivos diversos e não poderão votar nas eleições
deste ano. Mais da metade (54%) dos cancelamentos foi em estados das
regiões Norte e Nordeste do país.
Somente em sete estados do Nordeste (BA, CE, MA, PB, PE, PI e RN)
houve 1,5 milhão de cancelamentos. O Nordeste é a região em que, segundo
o Datafolha, o candidato Fernando Haddad (PT) tem seu melhor
desempenho, com 26% das intenções de voto, e onde Jair Bolsonaro (PSL)
tem seu pior resultado (17%).
Neste ano, 147,3 milhões de eleitores estão cadastrados para irem às urnas.
A ação julgada no STF foi ajuizada na semana passada pelo PSB. O
partido argumentou que o cancelamento dos títulos feria o direito ao
voto e penalizava principalmente os eleitores pobres.
O PSB pediu que fosse concedida uma medida cautelar para permitir que
eleitores que faltaram ao recadastramento pudessem votar neste ano --se
não no primeiro turno, por inviabilidade técnica de incluí-los em tempo
hábil nas listas das seções eleitorais, ao menos no segundo turno.
"É uma quantidade muito grande, 2,4% do eleitorado. Isso pode fazer
diferença em pleitos proporcionais e majoritários", disse o advogado do
PSB, Daniel Sarmento.
"As pessoas que estão sujeitas ao cancelamento do título são as mais
pobres, as mais fracas, que não conseguem chegar à zona eleitoral para
fazer o recadastramento", afirmou Eugênio Aragão, advogado do PT, que
ingressou na ação como amicus curiae (amigo da corte, em latim). Os
argumentos não convenceram os ministros do Supremo.
Barroso, relator da ação, afirmou em seu voto que as revisões
eleitorais vêm sendo feitas da mesma forma há mais de uma década, que
nos anos anteriores não houve questionamentos desse tipo e que o TSE
demonstrou a inviabilidade técnica de inserir 3,4 milhões de eleitores
no sistema às vésperas da eleição.
Segundo o ministro, não há indícios de que o cancelamento prejudicou
intencionalmente determinados grupos ou de que venha a gerar prejuízo
para algum candidato.
Barroso afirmou que solicitou informações ao Tribunal Regional
Eleitoral da Bahia, estado com mais títulos cancelados (586,3 mil), para
saber como foi realizada a convocação dos eleitores para o
recadastramento.
A divulgação das informações, argumentou, foi feita nos boletos de
IPTU (na capital), nas contas de água e de luz (no restante do estado),
em campanhas publicitárias e até em estádios de futebol. "Não é possível
afirmar que a população não estava informada ou que não houve todo o
esforço possível para possibilitar o recadastramento."
Os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luiz Fux, Cármen
Lúcia, Gilmar Mendes e Dias Toffoli acompanharam o voto de Barroso.
Descordaram dele Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio.
Dois dos 11 ministros se declararam impedidos e não participaram do julgamento: Rosa Weber, presidente do TSE, e Celso de Mello.
Lewandowski abriu a divergência afirmando que os números de
cancelamento (3,4 milhões) são impressionantes. Antes de votar, o
ministro já havia pedido a palavra para demonstrar sua contrariedade.
"No interior do Amazonas, no interior do Pará, onde não há televisão,
não há internet, de repente ele [o cidadão] perde o direito de votar
porque os tecnocratas do TSE resolveram, talvez em boa hora,
recadastrar, aperfeiçoar o cadastro", disse.
"Eminente ministro Fachin, Vossa Excelência sabe que nas últimas
eleições presidenciais a diferença da candidata eleita [Dilma Rousseff]
para aquele que perdeu [Aécio Neves] foi de 3,5 milhões de votos.
Imagine se tivermos uma eleição apertada como essa. Uma diferença dessa
natureza numa eleição que já vem sendo questionada por determinados
setores, como é que vamos ficar?", afirmou.
Conforme proposta de Barroso, o julgamento da medida cautelar foi
convertido em julgamento de mérito, encerrando a análise do tema pelo
STF.
Especialistas em direito eleitoral ouvidos pela reportagem avaliam que foi acertada a decisão do tribunal.
"O exercício do sufrágio e do voto necessitam de uma uniformidade do
alistamento dado pelo registro obrigatório e pelo cadastro nacional de
eleitores, de modo a garantir a realidade do contingente de votantes",
diz Erick Pereira, presidente da comissão eleitoral da OAB (Ordem dos
Advogados do Brasil).
Gerente de operações do instituto Datafolha, Renata Nunes destaca,
porém, que as disparidades de regras nos municípios impedem uma
avaliação mais exata acerca dos impactos dos cancelamentos nas intenções
de voto. A obrigatoriedade e os prazos para o procedimento variavam de
acordo com a cidade.
"Muitas pessoas que deixaram de se recadastrar não sabem que estão
com os títulos cancelados. Não houve uma lógica igual nos estados, isso
gera confusão. Deveria ter havido uma meta igual no país."
Entenda o recadastramento biométrico
716 cidades passaram por cadastramento biométrico obrigatório para as eleições deste ano
Quantos eleitores já concluíram o processo?
Mais de 87,3 milhões (59% do eleitorado brasileiro). A meta do TSE é concluir o processo até 2022
Como foram os prazos?
Eles variaram de meses, como em municípios do Acre, a mais de um ano, caso de algumas cidades paulistas
E quem não cadastrou dentro do prazo?
Teve até 9 de maio deste ano para regularizar a situação
O que acontece com quem perdeu esse último prazo?
Quem não cadastrou a biometria
nas cidades obrigatórias teve o título cancelado. Com o fechamento do
cadastro nacional de eleitores, só será possível fazer a biometria ou
qualquer alteração no documento a partir de 5 de novembro