Por que Bolsonaro vai receber tanques de guerra no Planalto nesta terça-feira
Em um momento de forte tensão entre o governo Jair Bolsonaro e o Poder Judiciário, as Forças Armadas planejam um desfile militar inédito em frente ao Palácio do Planalto nesta terça-feira (10/08), segundo informou de manhã a Marinha em um comunicado oficial.
A nota disse que "um comboio com veículos blindados, armamentos e outros meios da Força de Fuzileiros da Esquadra, que partiu do Rio de Janeiro, passará por Brasília". O destino final é o Campo de Instrução de Formosa (CIF), onde é feito anualmente, desde 1988, um grande treinamento da Marinha, a chamada Operação Formosa.
No entanto, o comunicado sugere que o comboio passará em frente ao Palácio do Planalto, que fica na Praça dos Três Poderes, junto com o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF). Caso se confirme, esse ato em pleno dia útil seria inédito. Anualmente, há desfile militar na Esplanada dos Ministérios durante as celebrações do Feriado da Independência, em 7 de Setembro.
"Na oportunidade, às 8h30, no Palácio do Planalto, serão entregues ao Presidente da República, Jair Bolsonaro, e ao Ministro da Defesa, Walter Souza Braga Netto, os convites para comparecerem à Demonstração Operativa, que ocorrerá no dia 16 de agosto, no CIF", diz ainda o comunicado.
Será a primeira vez que a operação contará com a participação do Exército e da Força Aérea, segundo informou também a Marinha.
Na noite de segunda-feira, a Marinha publicou outra nota confirmando que um comboio com viaturas entregará ao presidente um convite para o evento de 16 de agosto. O texto não especifica quantos veículos iriam para o Planalto, afirmando apenas que "14 viaturas ficarão em exposição (…) em frente ao prédio da Marinha na Esplanada dos Ministérios".
Na mesma noite, o presidente Bolsonaro postou em suas redes sociais que a Marinha realiza exercícios em Formosa desde 1988 e que, "como a tropa vem do Rio, Brasília é passagem obrigatória".
Citando os presidentes do "STF, Câmara Federal, Senado, TCU, TSE, STJ, TST", além de parlamentares, o presidente convidou outras autoridades para receber "os cumprimentos da Força" na manhã de terça-feira.
Estudioso das Forças Armadas, o professor Juliano Cortinhas, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), disse à BBC News Brasil que não há precedente de iniciativa similar durante o período democrático brasileiro.
"Essas demonstrações são inéditas na nossa democracia. Em regimes ditatoriais, mais fechados, são comuns", afirmou.
"Um absurdo total. Algo impensável na democracia, principalmente porque o risco (de ruptura democrática) a partir das declarações do próprio presidente está muito elevado", criticou ainda.
Para ex-ministros da Defesa ouvidos pela BBC News Brasil, a entrega do convite com presença de tanques é uma tentativa de demonstração de força do presidente "ridícula", "inócua" e "golpista" que mostra, na verdade, como ele está acuado e enfraquecido.
O diplomata e ex-ministro da Defesa Celso Amorim classificou o plano como "um absurdo total" e uma "ameaça de golpe". Ministro da Defesa durante o governo de Michel Temer, Raul Jungmann afirma que o efeito do desfile de blindados será "desastroso", embora não acredite que ele vá interferir na votação da PEC do voto impresso na Câmara.
Já o ex-ministro da Defesa Jaques Wagner (que ocupou o cargo em 2015 durante o governo Dilma) afirma que a participação de Bolsonaro em um ato com tanques é uma tentativa "ridícula" de controlar o noticiário.
Voto impresso na Câmara
O desfile militar ocorre no mesmo dia em que a Câmara dos Deputados deve votar uma proposta de emenda constitucional (PEC) que visa implementar o voto impresso nas eleições de 2022, principal bandeira de Bolsonaro no momento.
Sem apresentar qualquer prova, o presidente diz que as urnas podem ser fraudadas e alega que apenas o voto impresso afastaria esse risco.
Já o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) rebate dizendo que a urna eletrônica conta com inúmeros mecanismos de segurança que garantem a integridade das eleições.
Na noite de segunda-feira, a nota da Marinha garantiu que a "entrega simbólica" do convite a Bolsonaro "foi planejada antes da agenda para a votação da PEC 135/2019 no Plenário da Câmara dos Deputados, não possuindo relação com a mesma".
Questionado se vê o desfile militar como uma tentativa do presidente de demonstrar força e pressionar a Justiça Eleitoral e o Congresso, o professor da UnB disse que "a própria dúvida (sobre essa intenção) já é grave e muito prejudicial para nossa democracia".
"A grande questão pra mim não é nem se perguntar o real significado de uma demonstração como essa, mas sim a gente refletir sobre o fato de que há muitas dúvidas a respeito de qual papel as Forças Armadas pretendem jogar no processo eleitoral que já foi iniciado de fato, porque o Bolsonaro está em campanha por todo o país, usando dinheiro público ilegalmente pra fazer campanha", disse o professor, em referência às viagens feitas pelo presidente para participar de atos políticos, como passeios de motocicleta com seus apoiadores.
Para Cortinhas, as Forças Armadas não têm cumprido sua função constitucional de proteger as instituições democráticas ao permitir que Bolsonaro ataque os outros Poderes. Nas últimas semanas, o ministro da Defesa chegou a fazer manifestações públicas em defesa do voto impresso e contra a atuação do senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid.
"Importante lembrar que uma das funções das Forças Armadas pelo artigo 142 da Constituição é proteger as nossas instituições democráticas, e elas não estão cumprindo o seu papel constitucional, portanto, já que o presidente vem atacando a cada dia com mais veemência a nossa democracia e as Forças Armadas estão caladas", criticou.
"E, indo além, estão se posicionando a favor dele, quando as Forças Armadas aceitam as falas do Bolsonaro quietas e contrapõem outros Poderes institucionalizados, como a Suprema Corte do nosso país, como o próprio Congresso. Então, eu vejo que é um momento extremamente preocupante", acrescentou.
Entenda agravamento da crise
O voto impresso se tornou nas últimas semanas epicentro de uma grave crise institucional entre o Palácio do Planalto e o Poder Judiciário, com Bolsonaro fazendo ataques diários à Justiça Eleitoral e a ministros do TSE e do STF, em especial Luís Roberto Barroso (presidente do TSE).
Do outro lado, TSE e STF reagiram abrindo investigações contra Bolsonaro. A apuração na Corte Eleitoral tem potencial de deixar o presidente inelegível por oito anos, impedindo-o de tentar a reeleição em 2022.
Já o ministro do STF Alexandre de Moraes incluiu Bolsonaro como investigado no inquérito das Fake News para apurar se o presidente cometeu crimes durante uma transmissão ao vivo realizada na quinta-feira passada (29/07) em que alegou ter indícios fortes de fraudes nas últimas eleições, usando vídeos antigos que circulam na internet já desmentidos pelo TSE.
Após a decisão, Bolsonaro disse que o inquérito é ilegal e ameaçou agir fora da Constituição.
"Está dentro das quatro linhas da Constituição (a decisão de Alexandre e Moraes)? Não está. Então o antídoto para isso também não é dentro das quatro linhas. Aqui ninguém é mais macho que ninguém", disse na quarta-feira (04/08).
"Sou presidente 24 horas por dia. O meu jogo é dentro das quatro linhas (da Constituição), mas se sair das quatro linhas, sou obrigado a sair das quatro linhas. É como o inquérito do Alexandre de Moraes: ele investiga, ele pune e ele prende. Se eu perder (as eleições) vou recorrer ao próprio TSE? Não tem cabimento isso", declarou também.
Depois dessas falas, o presidente do STF, Luiz Fux, cancelou reunião que havia convocado com Bolsonaro e os presidentes da Câmara (Arthur Lira) e do Senado (Rodrigo Pacheco) para tentar reduzir a crise.
"O presidente da República tem reiterado ofensas e ataques de inverdades a integrantes desta Corte, em especial os ministros Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes. Sendo certo que, quando se atinge um dos integrantes, se atinge a Corte por inteiro", disse Fux ao cancelar o encontro.
"Além disso, sua excelência (Bolsonaro) mantém a divulgação de interpretações equivocadas de decisões do plenário bem como insiste em colocar sob suspeição a higidez do processo eleitoral brasileiro", acrescentou.
Parlamentares de oposição farão ato em frente ao Congresso contra o desfile militar
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Parlamentares de oposição farão manifestação em defesa do Congresso Nacional na manhã desta terça-feira (10), em contraposição ao desfile de blindados em frente ao Palácio do Planalto, marcado para a mesma data.
Eles pretendem se contrapor ao evento militar visto como tentativa de intimidação do Legislativo a votação da PEC do voto impresso defendida por Jair Bolsonaro pode acontecer nesta terça-feira (10).
Os parlamentares se reunirão no salão negro da Câmara dos Deputados às 10h e posteriormente se colocarão em frente ao Congresso, para simbolizar a defesa do Legislativo.
"É uma demonstração de como o governo é tutelado e como essa simbiose entre governo e Forças Armadas está comprometendo a independência das Forças Armadas. Elas, caso se prestem a esse papel, estarão prestando um desserviço à democracia. O Brasil é um país democrático", diz José Guimarães (CE), deputado e vice-presidente do PT.
"O Congresso é um dos sustentáculos da democracia e não pode ser pressionado por tanques para votar a PEC do voto impresso. O Congresso tem independência. Assim foi que nos ensinou Ulysses Guimarães. Temos que reagir à altura a essa atitude fascista e ditatorial do governo Bolsonaro", completa.
"Não aceitamos interferência no Poder Legislativo. E se tem alguém sério aqui tem que nos ajudar. Aqui não é quartel-general do Bolsonaro nem das Forças Armadas. Aqui é o quartel-general da democracia", conclui.
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Em meio à polêmica causada pelo desfile de blindados previsto para esta terça-feira (10), o presidente Jair Bolsonaro postou em suas redes sociais um convite para que autoridades de Brasília, como os presidentes das Casas Legislativas e do Judiciário, recebam também os veículos militares.
O desfile dos veículos provocou reação por ocorrer em um momento de tensão institucional, além de ser a data prevista para que a Câmara dos Deputados vote a PEC (proposta de emenda à Constituição) do voto impresso. O presidente já assume a possibilidade de derrota.
Mesmo aliados do presidente reagiram ao evento militar. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que se trata de uma "coincidência trágica" que o desfile dos blindados aconteça no mesmo dia previsto para a votação da PEC.
"Sr. Presidente do ... STF, Câmara Federal, Senado, TCU, TSE, STJ, TST, Deputados, Senadores... : Como ocorre desde 1988, a nossa Marinha realiza exercícios em Formosa/GO. Como a tropa vem do Rio, Brasília é passagem obrigatória. Muito me honraria sua presença amanhã na Presidência (08h30), onde receberei os cumprimentos da Força e lhes desejarei boa sorte na missão", divulgou em rede social Bolsonaro, que completa sua assinatura lembrando ser o "Chefe Supremo das Forças Armadas".
O Ministério da Defesa planejou para esta terça-feira um desfile de blindados da Marinha que passará em frente ao Palácio do Planalto, em Brasília. Os veículos militares seguem para Formosa (GO), onde será realizado um grande exercício militar, com a presença de membros não apenas da Marinha como também do Exército e da Aeronáutica.
Embora seja um exercício de adestramento tradicional da Marinha, essa seria a primeira vez que os blindados entrariam em Brasília. Além disso, eles seguirão para a Praça dos Três Poderes, em um momento de grande tensão entre os poderes, em particular entre o Executivo e o Judiciário.
O evento ocorre, por exemplo, em meio uma série de declarações golpistas de Bolsonaro e na semana em que está prevista a votação do voto impresso na Câmara.
Bolsonaro vem promovendo uma série de ataques ao sistema eleitoral brasileiro. Nessa cruzada, vem criticando diretamente autoridades do judiciário. Usou mesmo palavras de baixo calão contra o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Luis Roberto Barroso, e disse sobre o ministro do STF Alexandre de Moraes que "sua hora vai chegar".
A Marinha buscou minimizar o desfile, afirmando que se trata apenas da entrega de um convite a Bolsonaro e ao ministro Walter Braga Netto (Defesa) para que as autoridades participem, na próxima segunda-feira (16), de um tradicional exercício da Marinha que ocorre desde 1988.
O evento não consta na agenda oficial desta terça-feira do presidente da República, mas autoridades no Planalto consideram sua presença como certa. Também não consta na agenda oficial divulgada, mas é possível que Bolsonaro receba alguns ministros para uma reunião no mesmo horário da chegada dos blindados.
De acordo com a assessoria de comunicação da Defesa, trata-se de uma ação de divulgação do exercício. Segundo a Marinha, a Operação Formosa envolverá neste ano mais de 2.500 militares das três Forças é a primeira edição que Exército e Aeronáutica participam.
No total, serão 150 diferentes equipamentos, entre carros de combate, blindados, aeronaves e lançadores de mísseis e foguetes. O objetivo é simular uma operação anfíbia.
"Nesta terça-feira, pela manhã, comboio com veículos blindados, armamentos e outros meios da Força de Fuzileiros da Esquadra, que partiu do Rio de Janeiro, passará por Brasília, a caminho do Campo de Instrução de Formosa", afirma.
"Na oportunidade, às 8h30, no Palácio do Planalto, serão entregues ao presidente da República, Jair Bolsonaro, e ao ministro da Defesa, Walter Souza Braga Netto, os convites para comparecerem à demonstração operativa", completa a Marinha, em nota.
O Ministério da Defesa foi questionado pela reportagem, mas não informou qual é o custo total do desfile de blindados nem quantos veículos e militares vão participar do evento. A pasta informou apenas que iria repassar o pedido para a assessoria de imprensa da Marinha, organizadora do evento, que também não se manifestou sobre essas questões.
No início da noite de segunda-feira, a Marinha divulgou nota na qual buscou esclarecer alguns pontos e amenizar o mal-estar causado pelo evento.
A Força afirma que a entrega simbólica dos convites foi planejada antes do anúncio da data da votação da PEC do voto impresso, que ocorre nesta terça-feira, e que não há relação nenhuma entre os dois acontecimentos ou com "qualquer ato em curso nos Poderes da República".
O texto da Marinha também afirma que, do comboio total de blindados, 14 viaturas vão ficar em exposição para apresentar à sociedade brasileira os equipamentos e preparo. A Marinha, por outro lado, não esclareceu se esses serão os únicos veículos que percorrerão a Esplanada dos Ministérios.
"A entrega do convite ao presidente da República foi planejada para contemplar um comboio composto de algumas das principais viaturas, cujo total da Operação é 150, e que iniciaram o deslocamento para o Planalto Central desde o dia 8 de julho", afirma o texto.
"Desse comboio, 14 viaturas ficarão em exposição durante esta terça-feira, em frente ao prédio da Marinha na Esplanada dos Ministérios. Os eventos buscam valorizar e apresentar à sociedade brasileira o aprestamento dos meios operativos da nossa Marinha", completa.
Às vésperas do desfile de blindados, Bolsonaro se reuniu fora da sua agenda oficial com o ministro Walter Braga Netto. O presidente se dirigiu na tarde desta segunda a um prédio do Ministério da Economia, para um compromisso na Autoridade Nacional de Proteção de Dados.
Após mais de uma hora que estava no prédio, Braga Netto chegou ao local e permaneceu cerca de 15 minutos. Saiu em seguida, sem falar com a imprensa. Bolsonaro ainda permaneceu no prédio do ministério, mas também saiu sem dar declarações.
A iniciativa do militares repercutiu entre congressistas e gerou reações.
Parlamentares de centro, centro-direita e esquerda pretendem, durante o desfile, se posicionar em silêncio na rampa do Congresso com cartazes em defesa da democracia.
Em seu desespero de besta acuada, Bolsonaro tenta demonstrar força colocando tanques na rua. O Parlamento reagirá à altura mostrando a fraqueza do presidente, que faz um teatro para seus militantes para justificar a previsível derrota do voto impresso, afirmou o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), que organizou a mobilização.
Mostraremos, juntando parlamentares de direita, de centro e de esquerda, que a democracia brasileira é mais poderosa que Bolsonaro. O tiro sairá pela culatra.
A deputada Perpétua Almeida (PC do B-AC) avalia que a realização do desfile é uma tentativa de Bolsonaro de pressionar os parlamentares e passar a ideia de que tem força, quando, de fato, não tem.
Esse trabalho das Forças Armadas é corriqueiro, necessário. Agora, quando os blindados passam pela Esplanada dos Ministérios num dia importante como esse, é o Bolsonaro tentando usar as Forças Armadas para seu projeto pessoal, disse. Se a ideia é intimidar, é o inverso que vai acontecer, porque ninguém gosta disso. Os blindados do Bolsonaro podem passar por cima do pé dele.
"Nossa resposta será a derrota do voto impresso, diz o líder do PT na Câmara, Bohn Gass (RS).
Vice-presidente da CPI da Covid no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) atacou, em uma rede social, a presença de blindados na Esplanada nesta terça.
"Alguns avisos ao sr. inquilino do Palácio do Planalto: 1) Colocar tanques na rua não é demonstração de força, e sim de COVARDIA; 2) Os tanques não são seus, pertencem à Nação; 3) Quer tentar golpe Sr. @jairbolsonaro? É o crime que falta para lhe colocarmos na cadeia", escreveu.
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